A minha memória da viagem de trem de Curitiba a Morretes, originalmente até Paranaguá, vem da minha infância. Da foto do trem cruzando uma ponte sobre um precipício na capa de uma caixa de lápis de cor da Faber-Castell. Aquela imagem fascinava o moleque que passava as tardes montando o Ferrorama na sala de casa. Anos depois, descobri que aquela imagem era real e possível. Agora, passando por Curitiba mais uma vez, resolvi fazer o passeio.
No Brasil, onde somos carentes de viagens de trem, ter um dos poucos trajetos em funcionamento e ainda sendo eleito pelo jornal britânico The Guardian como uma das 10 viagens de trem mais espetaculares do mundo, é um privilégio e tanto. Juntando o desejo de criança, a paixão por trens e o apelo do The Guardian, embarquei no trem de Curitiba a Morretes, operado pela Serra Verde Express.
Um pouco de história
A estrada de ferro Curitiba a Paranaguá é considerada um dos maiores feitos de engenharia do século passado, por vencer os desafios da Serra do Mar, passando rente a abismos, vales e rios atingindo uma altitude de 950 metros acima do nível do mar.
Foi toda projetada no Brasil e construída na Bélgica, isso porque na época o Brasil não tinha nenhuma empresa de siderurgia capaz de fabricar os trilhos e pontes para viabilizar a construção da estrada de ferro, na verdade, todas as primeiras estradas de ferro brasileiras foram projetadas aqui e construídas na europa.
Em 2 de fevereiro de 1885 foi inaugurada a Estrada de Ferro Curitiba Paranaguá e desde então, o trecho nunca deixou de ser usado. Com o desaparecimento dos trens de passageiros, suprimido pelo transporte rodoviário, a via passou a ser usada em quase sua totalidade por trens de cargas até o Porto de Paranaguá e por trens turísticos.
Como é a viagem de trem de Curitiba a Morretes
O trem parte da Rodoferroviária de Curitiba, um complexo que funciona como rodoviária e estação de trem. Eu comprei a passagem faltando uns 40 minutos para a partida, mas por ser um dia de semana, inverno e chuvoso, não foi complicado conseguir uma passagem. Na alta temporada e finais de semana é outra história.
O embarque foi iniciado pontualmente às 8h da manhã e o trem partiu às 8h15 com pontualidade britânica. Os vagões são antigos, construídos nos anos 60, uma herança da antiga Rede Ferroviária Federal com seus bancos de couro sem reclino ou qualquer outro tipo de conforto, mas super conservados. É uma maneira bacana de mergulhar um pouco no passado e sentir como eram feitas as viagens de trem de passageiros entre a capital paranaense e o litoral.
O primeiro trecho da viagem é urbano, passando por dentro de Curitiba e São José dos Pinhais, na região metropolitana. Nesse trecho, o trem trafega a apenas 20 quilômetros por hora, confesso que é um pouco cansativo. Depois que o trem passa pelo primeiro dos 13 túneis e entra de vez na mata, é quando a viagem começa.
O trem vai acompanhando o leito do Rio Ipiranga, passando por pontes centenárias e mostrando um rio de águas incrivelmente limpas. Ao se aproximar do trecho mais desafiador da viagem, cruzamos o Cânion Ipiranga, que já dá o tom do que vem adiante.
Depois de atravessar a belíssima Ponte São João, avistamos o abismo da Serra do Mar, o trem segue serpenteando o abismo, passando por pontes e túneis até que atinge o Viaduto do Carvalho, um viaduto em curva na beira do penhasco a centenas de metros de altura seguido de um túnel. A sensação é de estar voando sobre as nuvens. Haja coração! O Viaduto do Carvalho surgiu de um erro durante a explosão para construção de mais um túnel, por conta do desabamento além do esperado, os engenheiros optaram por fazer o viaduto em curva que termina em outro túnel.
Depois, a viagem segue montanha abaixo entre mais túneis, vales, pontes históricas e mata fechada até chegar a apenas 10 metros acima do nível do mar, na pequena e linda cidade de Morretes.
Ao longo do caminho, vemos uma série de pequenas estações abandonadas. Algumas são usadas pela concessionária ALL (América Latina Logística) como ponto de apoio, uma delas foi comprada por um empresário local e transformada em restaurante e muitas em ruínas. A viagem de trem entre Curitiba e Morretes é um mergulho nessa história.
A viagem dura entre 3h30 e 4 horas, apesar de ser um trecho curto, o trem só trafega a uma velocidade máxima de 25 quilômetros por hora, por razões de segurança. O que deixa a viagem um pouco cansativa e demorada.
A todo momento, precisamos parar para dar passagem a outros trens cargueiros que andam na mesma linha e são comboios imensos de até 60 vagões, o que ajuda a justificar o tempo de viagem. Nesse trajeto, a única estação no meio do caminho onde acontecem embarques e desembarques é a do Marumbi, muito procurada por montanhistas que vão escalar o conjunto de Picos do Marumbi.
Quanto custa?
A viagem não é barata, o trecho custa R$109,00 e se for comprar a ida e volta, o retorno custa R$80,00. Eu fiz a ida e volta e trem, poderia voltar de ônibus que custa R$18,50 e faz a viagem pela histórica Estrada da Graciosa em 1h30 de viagem.
Eu acertei em fazer a ida e volta de trem, pois na ida, o tempo estava bem encoberto e não deu para ver muitas das paisagens, na volta o tempo estava mais limpo e valeu a pena.
Quando ir e onde se sentar?
Como o inverno em Curitiba e na Serra do Mar é bem chuvoso, creio que o verão seja a melhor época. Saindo de Curitiba, as melhores paisagens ficam do lado esquerdo do trem e na volta, do lado direito.
Como o pessoal de vendas não consegue precisar a posição em que os vagões serão estacionados, não dá para escolher um lado ou outro. Tem que contar com a sorte e no meu caso, ambos os lugares eram do lado esquerdo e como o trem estava com menos da metade de lotação, dava para escolher o melhor lugar para sentar.
Se você só quiser fazer um trecho, no inverno escolha a volta para Curitiba, o trem sai da estação de Morretes às 15h. No verão, escolha a ida, pois as chances de chover no fim do dia são maiores.
Morretes é uma cidade muito bonitinha, o blog Fui Ser Viajante tem algumas dicas da cidade (leia aqui).
Onde comprar as passagens
Na Rodoferroviária de Curitiba, bloco de onde saem os trens, ficam uma balcão e uma sala de vendas da Serra Verde Express, na baixa temporada e em dias de semana, pode comprar na hora. Na alta temporada, finais de semana e férias, é melhor comprar com antecedência. Eles tem a classe turística, primeira classe e trem de luxo, que são as icônicas Litorinas. Todos os preços aqui.
Minha opinião
A viagem de trem de Curitiba a Morretes é um passeio imperdível, quem puder fazer, faça! Achei caro, mas mesmo assim eu não poderia deixar de fazer. Como disse, os vagões da classe turística são antigos e nada de ar condicionado ou aquecedor e eu quase morri de frio.
Ida e volta é meio desnecessário, mas no meu caso foi legal pois como o tempo estava meio encoberto na ida, a volta deu para ver muitas paisagens que não consegui ver na ida.
Fuja que é cilada
A Serra Verde Express vende um pacote chamado “Por do Sol”, pode ser super bacana, só que não! Como o trem sai de Morretes às 15h, o por do sol acontece na chegada a Curitiba. Nada de por do sol apreciando as belezas da Serra do Mar como eles dizem, amiguinhos.
Na verdade, achei vários pacotes vendidos pequenas ciladas para turistas, como o que oferece almoço, sendo que você pode comer bem em todos os restaurantes de Morretes pagando bem pouco.
Um pacote que eu achei que vale a pena é o de R$125,00 que inclui um trecho de trem e outro de van. Dá uma conferida lá.
Dá uma olhada no vídeo:
*Foto de capa: Carlos Renato Fernandes | Divulgação Serra Verde Express | Litorina (trem de luxo)
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Oi Fabricio, bom dia.
Pesquisando sobre Curitiba, vim parar aqui no seu site(aliás, parabéns!).
Essa viagem de Trem Curitiba-Morretes é muito cilada se for feita toda com a Serra Verde Express?
Como tenho pouco tempo em Curitiba, pensei na praticidade de comprar um pacote Turístico que oferece o almo, ida a Antonina e volta a Curitiba de van, mas acabei meio que desanimando vendo que posso fazer o mesmo por valores bem inferiores.
Oi Ígor, tudo bem? O passeio é bacana, acho que vale a pena, mas só um trecho. Eu fiz ida e volta e foi repetitivo, cansativo e caro. Se você puder, vai de trem pela manhã e volta a tarde de ônibus pela Estrada da Graciosa, vai sair bemmmm mais barato.
Oi, Fabrício! Adorei seu blog e seu relato se referindo a infância, eu me lembro mais ou menos dessa capa da Faber Castell rsrs.
Infelizmente, nós não tivemos tempo hábil pra fazer o passeio de trem, mas eu queria e quero muito! Após termos feito o tour dos vinhos na Serra Gaúcha, na Maria Fumaça, fiquei encantada com passeios de trem, mas como tínhamos apenas três dias não consegui encaixar.
Mas voltaremos a região em janeiro e já incluí esse passeio em um dos dias que estaremos em Curitiba, pois eu imagino que deva ser imperdível mesmo!!
Obrigada pelas dicas e já vou fugir das ciladas rs.
Abraços, seu blog é ótimo!!
Oi Paula, acredita que o passeio da Maria Fumaça na Serra Gaúcha foi uma das minhas maiores decepções? Eu era novo, estava louco pra fazer o passeio e a agência que me vendeu o pacote, vendeu o assento número 301, mas o trem só tem 300 cadeiras. Ou seja, overbooking e eu fiquei na estação =(