Essa é uma história que eu conto para todos os meus amigos, principalmente numa mesa de bar com uma bela cerveja gelada e todo mundo fica meio de boca aberta, então, por que não contar aqui para vocês?
Em novembro do ano passado eu fui para Sarajevo a convite do órgão de turismo da Bósnia e Herzegóvina. Os caras queriam atrair turistas para o país e o Vou na Janela foi convidado ajudar a divulgar a Bósnia e Sarajevo como uma boa opção para o turismo.
Eu estava em Munique, na Alemanha, e saí de lá num vôo da Lufthansa direto para Sarajevo. O avião deveria partir às 0h30, mas um atraso não explicado de mais de uma hora resultou em uma chegada num horário péssimo em Sarajevo.
Eu desci do avião numa madrugada gélida quando a temperatura girava em torno de uns -2 graus. Desembarcamos na pista, pois os poucos fingers já estavam inoperante naquela hora. Qual a razão? O aeroporto de Sarajevo fecha durante a madrugada.
O único funcionário na imigração só olhava os passaportes e deixava passar, sorte minha, não falo uma linha de bósnio, russo ou alguma língua impronunciável daquela parte do mundo que se recusa a falar inglês.
Meu vôo estava bem vazio e em questão de minutos todo mundo já tinha desembarcado, passado pelos trâmites legais e já estávamos no saguão de desembarque. Os poucos passageiros rapidamente desapareceram e quando me dei conta, eu estava sozinho naquele aeroporto fechado, deserto, sem uma viva alma.
O combinado era que o órgão de turismo enviasse um carro para me buscar e me levar até o hotel, mas na porta do aeroporto não tinham nem um mísero taxi, tão pouco ônibus ou qualquer outro meio de transporte que me levasse dali.
O aeroporto de Sarajevo nem é dos piores, é até bonitinho. Foi reconstruído depois da guerra, mas parece uma rodoviária mais ajeitadinha.
Procurei o balcão de informações e claro, estava fechado. Lufthansa? Fechada! Encontrei dois guardas e fui pedir informações e eles além de não falar uma linha de inglês, nitidamente tiraram uma com a minha cara.
Esse é aquele momento em que você começa a ficar tenso e se lembrar de filmes como O Albergue, se imaginando em situações assim. O que eu podia fazer? Nada a essa altura da madrugada.
O que me deixava mais tranquilo é que uma hora ia amanhecer, o aeroporto ia abrir e um taxi apareceria. Mas às 4h da manhã nada acontecia e outros policiais começaram a aparecer e me encarar de forma estranha.
As horas passavam e o frio aumentava, nem preciso dizer que não tinha aquecedor nessa parte do aeroporto. Uns guardar se aproximaram e pediram meu passaporte, só consegui entender “passspoortéee”, o outro me cutucou e disse “documenteeee”, achando que eu fosse italiano, naquele “italiano” bem Tarantinesco, o cara deve ter assistido Bastardos Inglórios. Mostrei o passaporte brasileiro, um olhou pro outro com um sorriso debochado de canta de boca, me devolveram meu “documenteee” e foram embora.
Instantes depois entra um cara pela porta de entrada com uma plaquinha escrita “Fabrizio Muora”, ok, eu posso ser esse cara se você quiser! Era o motorista que estava dormindo no carro, já que o “meu vôo estava atrasado”.
O cara tinha toda pinta de turco, com traços fortes, brutos e um pouco desajeitado. Apesar da aparência, ele era russo e falava um inglês macarrônico mas que dava pra se comunicar. Pegou a minha mala e jogou no porta malas daquele Lada 1989 que ainda não sei a cor, mas era algo entre vômito e diarréia.
Durante o trajeto, lugares escuros e estranhos. Marcas da Guerra da Bósnia por todos os cantos, já se passaram 20 anos mas está tudo lá. E aí nosso amigo Dimitri (me lembrei do nome dele) saiu da estrada principal e começou a cortar caminho por lugares que não desejo pra ninguém ficar perdido ali. As cenas de O Albergue continuavam girando na minha cabeça numa mistura de pavor e sono, isso para não falar da fome da jaula que eu estava. Sobre isso só posso dizer que dá pra sobreviver comendo barrinhas de cereais e frutas secas.
Mas quando tudo parecia perdido, chegamos ao hotel! Só pensava em um banho quente e uma cama pra dormir algumas horas. Mas claro, ainda teria uma dificuldade. A recepcionista estava dormindo e Dimitri, com toda sutileza de um bom Cossaco esmurrou a porta até a mocinha aparecer.
É como eu digo, as coisas podem dar errado, mas no fim, tudo se acerta.
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Tenho muita vontade de conhecer a Bossnia e Herzergovina !!! Acho interessante locais não tão turísticos. Também experiências como essa furam algumas frases que muitos brasileiros dizem, como que “no exterior todos falam inglês” ou “só no Brasil as coisasao funcionam”. Acho que experiências assim enriquecem muito nosso diário de viagem.
Exatamente, João!